6.3.07

Entrevista com Edgar Vasques: A melhor linguagem para a maior manifestação

Edgar Vasques, cartunista, desenhista, jornalista e arquiteto, faz parte de um dos grupos mais seletos do Brasil: o dos criadores. Entre muitíssimos trabalhos, esse gaúcho tem nas costas a criação do melhor anti-herói do Rio Grande do Sul, o Rango. Com esse personagem, Vasques faz uma crítica à fome e à pobreza. Além do Rango, Vasques faz ilustrações, entre elas a do fabuloso livro Cuca Fundida, do mestre Wood Allen e, também, do livro de Eduardo Bueno que fala a respeito do descobrimento do Brasil. Quer mais? Edgar Vasques já trabalhou nos principais veículos de comunicação da terrinha. Entre eles a Playboy (onde fazia tiras sobre o Analista de Bagé, ao lado do meu herói Luis Fernando Verissimo) e o revolucionário Pasquim (com o passo-fundense Tarso de Castro ensandecido criando polêmica ao lado dos outros também polêmicos Ziraldo, Jaguar e Cia. Ltda).


Agora, VOCÊ que é leitor inteligente dos armênios, e provavelmente fã do Edgar Vasques, senta que tenho uma pra Contar. O Edgar tá com uma super promoção! VOCÊ, camarada, pode adquirir um pacote com os livros dele (com verdadeiras relíquias pra colecionadores) por preços irrisórios. E de quebra ganhar um autógrafo em cada livro! É isso mesmo! VOCÊ pode TELEFONAR para o Vasques e bater um papinho para pedir os livros. Mas se você ficar com vergonha (como eu), pode mandar um e-mail pro cara. VOCÊ pede os livros e recebe em sua linda e confortável casa.

Bem, o pacote pra venda dos livros do Vasques está logo abaixo da entrevista aqui nos Armênios. E, se VOCÊ é um fã ardoroso do Edgar como eu, leia a entrevista abaixo, concedida com exclusividade para o site mais alternativo e finíssimo do norte do Rio Grande do Sul. Uhuuuuuuuu! Dá-lhe Edgar Vasques!

Pergunta - Quando você se envolveu com Histórias em Quadrinhos (HQ)? O que você lia na época que o influenciou?

Resposta - Comecei a ler HQ na infância (aprendi a ler com 6 anos), e curtia o Pato Donald, mas só quando os desenhos eram de Carl Barks ( não tinha assinatura, mas eu já tinha "olho clínico"). Lia também a revista "Cacique", da Secretaria Estadual da Educação, e ali me amarrei nos desenhos de Renato Canini, com seus personagens Corta-corta e Ligeirinho (duas formigas), o indiozinho Cacique, o gauchinho Ponche Verde e o neguinho Tibica. Queria (ainda quero) desenhar que nem eles. Depois, já na adolescência, descobri os maravilhosos quadrinhos ("Dr. Macarra") e secções ilustradas (na revista "O Cruzeiro") de Carlos Estevão (minha maior influência gráfica) e o grande "Pererê", do Ziraldo. A partir daí, o processo nunca cessou: tudo o que eu vejo e gosto, de alguma forma, me influencia.

P - Por que a escolha de temas impactantes em seus quadrinhos, como a pobreza e, de certo modo, a política?

R - Porque estes temas, a partir de um determinado momento, me impactaram. Assim, foi o impacto da fome e da miséria que me levaram a abordá-los. Impressionado, usei a linguagem que melhor dominava para me manifestar, e dividir com os outros o que me impressionou.

P - O que você levou em conta para criar o Rango?

R - Minha experiência de conviver com a miséria no centro de Porto Alegre, uma área residencial que sofreu um processo de decadência (que coincidiu com o começo da minha adolescência). Passaram a coexistir ali a classe média e diversas gradações de pobreza, que eu acabei registrando no Rango. E o descompasso entre essa situação, e o discurso ufanista da ditadura, que censurava qualquer menção aos problemas, que eram visíveis, óbvios (também influenciaram a criação do personagem).

P - Além do Rango, você fez muitíssimas outras coisas, entre elas desenhos para livros e, em especial, os desenhos do livro de Eduardo Bueno que abarca o descobrimento do Brasil. Como foi essa experiência?

R - Não foi o primeiro nem o único trabalho de ilustração que tenho feito, embora tenha sido marcante, pelo exercício da documentação e o trabalho com aquarela. Gostei bastante do resultado, apesar de algumas bobagens das designers gráficas, e da tendinite crônica que adquiri por andar pra cima e pra baixo com 8 kg de livros de referência numa pasta...

P - Você está produzindo uma versão em aquarela do analista de bagé, da época em que era publicado na playboy. Como é esse projeto? O livro sai esse ano, né?

R - Trata-se de uma coletânea das HQs que Verissimo e eu fizemos mensalmente para "Playboy" durante 7 anos. São 82 páginas a cores (a maioria em aquarela), e está na fase da criação da capa. Deve sair esse ano, e especialmente dirigido às mulheres...

P - Quem é, ou quais são, seus grandes ídolos nos quadrinhos?

R - São aqueles que eu citei na primeira resposta, seguidos de dezenas de outros que eu nem me animo a começar a citar (até porque a lista cresce dia a dia). Mas tem um cara que me parece o maior desenhista vivo, e não só nos quadrinhos ( na ilustração e na caricatura também): o argentino Carlos Nine.

P - Há algum personagem de outro autor que você gostaria de ter criado?

R - Acho que não, embora curta e admire muitos personagens alheios, inclusive alguns que eu imitei na infância e adolescência.

P - Você se identifica com seus personagens? Você já viveu algum momento em que aparece nas suas histórias?

R - Ainda não fui autobiográfico nas minhas histórias. Sempre fui tímido, preferindo observar os outros do que falar de mim. Talvez ainda não tenha amadurecido o bastante para me expor pessoalmente na minha obra.

P - Você já teve alguma história vetada, por abordar temas impróprios? O que você pensa sobre isso?

R - Houve alguns solavancos de percurso, tanto com a censura oficial quanto com alguns editores, mas história vetada inteira não. Meu caso é mais pesado: por causa dos meus temas e das minhas opiniões, fui vetado por inteiro: passei pelo menos uns 15 anos praticamente excluído da mídia (de certa forma, ainda estou). Em que jornal ou revista vocês lêem o meu trabalho?

P - Como era trabalhar no Pasquim, com aquela equipe que revolucionou o jornalismo brasileiro?

R - Foi legal (muitos deles eram meus ídolos), mas curto. O Pasquim foi recolhido de todas as bancas do Brasil, em 77, por causa de algumas tiras do Rango. A idéia dos censores era atingir o pasquim, mas quem dançou fui eu, que nunca mais publiquei lá.

P - Como você se relaciona com a crítica?

R - Acho que o mercado de HQ no Brasil é tão desorganizado que não gerou uma crítica profissional (que aparece, em geral, para orientar um público consumidor). Muitas vezes, os próprios quadrinistas assumem o papel de analisar o que está rolando, coisa que eu mesmo tenho feito, de forma intermitente. Na verdade, até sinto falta de uma crítica competente e isenta pra balizar a produção da HQ brasileira.

P - Quais são seus projetos futuros?

R - Nos quadrinhos, estou voltando (depois de 8 anos) a desenhar tiras novas do Rango: finalmente apareceu um jornal com uma proposta profissional decente, é o mensário "Extra Classe", do Sindicato dos Professores do Ensino Privado do RS. Fora isso, tenho várias idéias: um livro infantil (O Morcêgo Chorão), uma novela gráfica (que tô "cozinhando" há dez anos) sobre um pintor de cavernas na pré-história, chamada "O Captor". Além disso, espero abrir uma nova frente: transmitir o conhecimento acumulado, não só através de oficinas, mas em cursos de extensão em universidades.

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