28.11.07

O BOXEADOR DAS PALAVRAS

JEAN DUTRA BERTHIER

Para ele escrever era sentar-se diante de uma máquina de escrever e abrir uma veia. Norman Mailer, o maior ícone da esquerda literária teve uma intensa carreira ao longo de décadas como escritor, cineasta e jornalista. Falecido no dia 10 de novembro passado encarou várias discussões desafiando outros intelectuais. Seu primeiro livro Os Nus e os Mortos, foi um sucesso de vendas abordando a Guerra no Pacífico e as conseqüências traumáticas nos soldados.

Mailer teve uma definição que o identificava totalmente: baixinho, forte como um touro, beberrão, drogado e língua de trapo. Foi casado seis vezes e chegou a esfaquear a segunda mulher. Seguia a linha do tipo machão tal qual Hemingway, acreditando que a literatura era para escritores como a testosterona efervescente. Seu esporte preferido era justamente o boxe tendo lutado por um tempo como amador e escrevendo a obra A Luta, que aborda uma famosa disputa entre Mohamed Ali e George Foreman.

Considerado como um dos expoentes do new journalism, que mesclava jornalismo tradicional com elementos da literatura, Mailer chegou a ser candidato a prefeito de Nova York, numa bizarra campanha em 1969. Teve posição marcante abordando diversos acontecimentos na sociedade americana como a contracultura, Vietnã, feminismo e os presidentes da década de 60 até George W. Bush. Em sua obra O Evangelho segundo o filho de 1997, numa atitude ousada, traz Jesus Cristo em primeira pessoa como narrador. Definia-se Mailer como um conservador de esquerda. Ficará lembrado como alguém que dissecava o comportamento dos políticos americanos e os escândalos da sociedade de seu país. Tudo isso feito em textos que não poupava críticas ferrenhas ao establishment e ao american way of life.

7.11.07

Botei mandioca para cozinhar, esqueci e saí pra trabalhar.

Uma mandioca linda. Oferecida, gentilmente, pela minha mãe, com o conselho: “Não cozinhem tudo, vão cozinhando à medida que forem fazendo almoços”. Na hora de botar a bendita no fogo, minha irmã, Gabriela, que atende pela alcunha de Binha Creide, colocou toda a mandioca. Eu alertei: “Vamos colocar só uma parte, como a mãe disse”. E ela: “Ah, então tira uma parte e põe de volta no congelador”. Só que eu, atucanada de e-mails de trabalhos, esqueci. Quando lembrei, todas as mandiocas já estavam pré-cozidas. Gabriela, na sua praticidade, largou: “ah, deixa assim! Igual não temos tempo de cozinhar todos os dias. Chegamos e já temos que sair! Assim fica pronto e congelamos a mandioca cozida”. Fim de papo. Até me motivou. Enchi a panela com mais água até a borda para não dar problemas e voltei ao computador. Dali a pouco recebi uma ligação e me mandei para a universidade.

Trabalhei, conversei, passei na livraria para pegar um livro encomendado, fui na farmácia e quando voltei pra casa ainda fiquei reclamando do portão, que não fechou. Permaneci mais uns 15 minutos conversando com o vizinho. Nisso já fazia umas três horas que eu havia saído de casa e deixado minha gatinha Lisa dormindo. Quando subo ao meu andar e paro na frente da porta do meu apartamento, senti um cheiro. “Meu Deus as mandiocas!”. Enquanto eu enfiava a chave para abrir a porta (e a porta do lugar onde moro tem duas fechaduras) nunca o tempo passou tão devagar. Naquela fração de segundos eu pensei no tempo que “aquilo” estava cozinhando. Logo algo se apoderou de minha imaginação: A Lisa. Dentro de casa, no meio daquilo tudo. E ainda pensei que poderia estar pegando fogo, ou algo do gênero.

Quando enfim consegui abrir a porta, a Lisa estava grudada na minha frente, e tinha uma cara de quem queria me dizer alguma coisa. Olhei pra frente e uma leve névoa esbranquiçada tomava parte da minha sala e toda a cozinha. Corri para a panela, com a mandioca já preta. Desliguei a boca do fogão agradecendo a Deus que não foi pior e me culpando até a alma. Corri e abracei a Lisa. Pedi desculpas por ser tão avoada. Beijava-a, pedia desculpas e falava para ela se manter calma. A Lisa começou a me lamber como quem diz “Você é quem tem que se acalmar”. Fiquei com tanta pena da Lisa... pensei no quanto ela deve ter se assustado com aquele negócio no fogão, um cheiro pela casa inteira e que ainda estava com todas as janelas fechadas! Depois da Lisa, minha pena recaiu sobre as mandiocas. Fiquei tão triste em ter queimado as mandiocas que muita gente sofre tanto para conseguir. Aproveitei e chorei. Chorei por ser avoada, por ter apavorado a Lisa e também pelas mandiocas.

Tentei ver se salvava alguma coisa, mas o estado (e o gosto!) estava deplorável. Corri pro MSN chorar as pitangas pra minha irmã que já disse: “Não precisa ir ligar pra mãe pra apavorar ela”. Mas eu já estava com o celular na mão. “Alô, mãe? Tu nem sabe...”. E contei tudo. Falei da querida Lisa e da pena das mandiocas. Minha mãe começou a rir. Mandou botar tudo fora, inclusive a panela (que eu ainda estou tentando limpar). “Fica calma que não foi nada”. Dali a pouco liga o Pai: “Não precisa ter pena das mandiocas! Podia ser muito pior! Isso já aconteceu comigo, com a mãe, com a vó! Não se preocupa!” E já aproveitou pra dizer que os gatinhos são agilizados quando essas coisas acontecem: eles se protegem. Não sei se a Lisa fugiu do cheiro ou se ficou com a fuça grudada na panela. Só sei que ela está bem. Aonde eu ia ela ia atrás me lamber... deduzi que a gatinha estava melhor do que eu, que passei no mínimo uma hora tremendo de susto.

Minha sorte foi ter posto muita água na panela. Foi isto que salvou a Lisa e a minha casa. Os vizinhos não perceberam cheiro algum, e não tinha vestígios de nada pelo corredor. Mas dentro do apartamento...tive que passar uns quantos “bom ar”, tomar banho, botar toda a roupa pra lavar, enfiar a Lisa tomar um ar na janela (pra respirar e dar uma arejada nos pêlos) e deixar toda a casa aberta durante um bom tempo. A sorte é que todos temos um anjo da guarda. E dizem que os anjos dos esquecidos e avoados são ainda mais eficientes.

Mas pobres das mandiocas...

E na outra semana deixei queimar de novo. Só que daí eu estava em casa... e só queimou um pouquinho...

5.11.07

Contradiçao com Wander Wildner

Além de gremista, o Wander ainda é ator!!!

Lindomar Castilho que se cuide


Ultimamente ando meio preocupada comigo mesma. Às vezes tenho a sensação de que estou enlouquecendo, aos poucos... Percebi minha paranóia nessa semana, quando fui dormir e todos os meus pensamentos vinham de forma escrita na minha cabeça.

Essa semana passei os dias inteiros lendo monografias. Tenho 8 orientandos de trabalho de conclusão do curso de graduação em Jornalismo da UPF. Oito! OITO!!! E estou ficando maluca. Tenho 8 trabalhos para ler (e corrigir!). Como todos os alunos fizeram 3 capítulos por monografia, são 8 x 3 = 24 capítulos. Cada capítulo eu tenho que ler umas 3 vezes. 24 x 3 = 72 capítulos lidos. Além de vesga, estou ficando louca.

Mas, efetivamente, devo admitir que demorei para sacar que eu estava pirando. Percebi quando minhas listas começaram a aumentar. Eu explico: Faço listas para tudo. Comprei uma agenda e faço tópicos de todas as coisas que tenho que fazer na vida. Tópicos arrumados, organizados, com letra bonita, letras frizadas (aquelas que agente escreve 20 vezes em cima da palavra para a letra ficar mais forte), uma frase abaixo da outra. Lá estão todos os meus compromissos:

- Corrigir monografia do Antonio;

- Corrigir monografia do Guilherme;

- Corrigir monografia da Carol;

- Cobrar dos outros 5 orientandos para mandarem material;

- Fazer a unha;

- Retirar 20 reais para pagar a Marga (faxineira);

- Comprar pão;

- Gravação da Beterraba Filmes;

- Fazer almoço.

E assim vai. “Lembrar de desligar a mandioca que está sendo cozinhada”, entre outras coisas.

Até aí, tudo bem, loucura normal, já que desde que me conheço por gente faço isso. Agora, pensamentos escritos na cabeça, aí já é demais. Uma noite dessas fui deitar e antes de pegar no sono me lembrei de uma coisa. E o pensamento que me lembrei (por exemplo: Como a Lisa, minha gata, estava um amor hoje. Até caçou uma mosca) começou a aparecer em forma de letras, e pingos nos is, e cedilha e todas as formas de letras; cursivas, de forma, tamanho grande e pequeno. Em vez de eu pensar, começava a se formar letra por letra na cabeça. E o engraçado é que nesses pensamentos o pingo do “i” sempre fica fazendo mil voltas antes de se aquietar.

Em resumo: quanto mais se lê, mais louco se fica.

E agora, como se não faltasse mais nada, estou com tara pela palavra “movimento” (seja ele cultural ou não) e aversão pela palavra “capítulo”. Lindomar Castilho que se cuide, com aquela música de ser doido demais.

P.S – Agora já posso ir na agenda fazer um certinho no tópico “escrever crônica”.... ufa! Um a menos!

Cinema, hoje, a R$ 2,00! Pena que não é aqui.

A rede Cinemark faz hoje uma massagem no ego dos espectadores de cinema no Brasil: os filmes brasileiros, gravados no ano passado, serão exibidos hoje nos cinemas ao preço de 2 pila. E isso que a Rede Cinemark chega a cobrar 21 reais o ingresso de alguns filmes de suas exibições...
Enfim, vale a pena se informar. Leia aqui, Jacaré! (como diz um amigo nosso...).

Pena que a promoção não chega a Passo Fundo, porque aqui são outras empresas exibidoras.... árrrrrrããã (imitação simplória do choro do Kiko...).

30.10.07

O salame


“O salame” foi o jornal impresso mais famoso de todos os tempos em Marau. E é verdade! A história é mais ou menos assim: Há muitos e muitos anos, lá por volta do início dos anos 1950, um grupo de trabalhadores do Frigorífico Borella resolveu fazer um jornal, com as notícias da cidade e também do estado. O tal Frigorífico Borella era famoso e respeitado. Uma espécie de “Perdigão Metasa” e “Sadia” dos tempos de hoje. Então os funcionários pensaram, pensaram e pensaram num nome para o primeiro jornal da cidade recém emancipada de Passo Fundo. Os trabalhadores decidiram pelo nome de “O salame”.

O jornal era mimeografado. Lembram do mimeógrafo? (Quando eu era pequena adorava ir com minha mãe na escola mimeografar as provas... saia a letra igualzinha a da minha mãe, só que azul. Parecia um carimbo gigante.) Pois “O Salame” era totalmente mimeografado. E as notícias do jornal não eram exageradamente factuais. Ao contrário, o jornal trazia notícias atuais da cidade, mas historietas envolvidas num tom de sátira e humor muito grande. Mais ou menos como o jornal O Pasquim. O que importava não era necessariamente a notícia, mas como ela era contada. E esse “como” na maioria das vezes fazia as pessoas rirem bastante. As principais piadas do jornal envolviam a política da cidade e também do Estado inteiro. Satirizavam a idéia de uma cidade que dependia do porco para produzir salame.

Fiquei encantada com a história do jornal “O salame”. Adoro jornais e histórias, então foi barbada gostar dessa. Soube da trajetória do famoso ”O Salame” através do trabalho de pesquisa da professora do curso de Publicidade e Propaganda da UPF Margarete de Césaro e da aluna Luana Pezzini. Elas estão estudando a publicidade no jornal. Aliás, as pessoas faziam propaganda de suas alfaiatarias, comércios, casas de tintas e de alimentos tudo escrito à mão. O dono chegava no jornal e deixava um bilhete. No outro dia o bilhete estava, igualzinho, no jornal.

Sempre fico fascinada com essas coisas antigas. Imagina poder ler um jornal escrito há 50 anos, ou mais que isso. Saber como eram as pessoas, as idéias, o comportamento da cidade e das famílias... perceber a evolução do mundo!... enfim; é por isso que o jornal impresso é tão sensacional. Porque só ele passa no tempo. Só ele se guarda por um período muito maior do que qualquer outro meio (é difícil encontrar uma fita de um programa de rádio ou de TV de mais de 50 anos atrás, a não ser que seja uma televisão ou uma emissora de rádio de prestígio. Caso contrário, é difícil conservar este material. Esta dificuldade o jornal não tem. Seu único e mortal problema são as traças. E mesmo assim, a luta delas para vencer o inimigo, é muito longa).

Salvem o jornal! É a história e a memória de um tempo!

23.10.07

Um meme!

"Se você vai morrer em público, tenha pronto algo memorável para dizer".

P.J. O'Rourke. Etiqueta Moderna: finas maneiras para gente grossa.


1. Pegue um livro próximo (PRÓXIMO, não procure);
2. Abra-o na página 161 (se não tiver página 161, pegue a mais próxima);
3. Procure a 5ª frase completa;
4. Poste essa frase em seu blog;
5. Não escolha a melhor frase nem o melhor livro;
6. Coloque sua frase nos comentários do blog (pra que todos vejam…)
7. Repasse para outros 5 blogs.

Recebi do Blog da Biba.... e passo para os seguintes blogs: Blog do Fábio Rockenbach, Blog do Paulo, Blog do Dóro, Blog da Soninha e Blog do Bruno Medina.

16.10.07

Acidentes que fazem pensar

Para meu irmão Tchesco

As últimas semanas têm marcado o Brasil pela quantidade de acidentes graves com vítimas fatais. Um dos maiores e mais tristes foi em Santa Catarina, onde um caminhão bateu de frente num ônibus cheio de passageiros. O pior veio depois: enquanto muitas pessoas ajudavam a salvar as vidas na pista, um segundo caminhão, aparentemente desgovernado e sem freios, invadiu a pista e rumou para cima das dezenas de pessoas que trabalhavam no local. Muitas delas morreram.

É nessas grandes tragédias que, na minha opinião, a gente pára pra pensar na vida. As pessoas se deparam com a vulnerabilidade do que significa “viver”. A linha é muito tênue entre o viver e o morrer.

O que acontece é que as pessoas passam todos os seus dias preocupados com a saliência dos colegas no trabalho, com o dinheiro que sempre acaba no dia 15 do mês e ainda faltam mais 15 dias para terminar o tal mês, permanecem preocupados com a casa que está empoeirada e com o sofá rasgado, com as roupas que já estão velhas e batidas, com o carro que acaba a bateria e ninguém descobre o problema; e assim vai. Aí durante à noite as pessoas sentam para relaxar em frente à TV e passam a almejar a “beleza estética e material” da vida que passa na televisão.

E, assim, a criatura se esquece de olhar para trás, ou seja, para tudo o que ela já conquistou. Esquece de pensar que tem cama pra dormir, comida pra comer, trabalho para se sustentar... E estes fundamentos são matéria-prima para uma passagem na terra de modo sossegado. No dia-a-dia as pessoas também se esquecem de que na verdade elas são corpo e mente. Espírito e matéria. E para que isto se sustente, a serenidade é extremamente importante, aliada às nossas relações de afeto. Explico.

Quando aconteceu o tal acidente em Santa Catarina, fiquei sabendo no outro dia. Liguei a televisão e quase chorei com o depoimento das pessoas. Permaneci chocada com tudo aquilo. No mesmo dia fui viajar, já com aquele aperto no coração. Só dois dias depois fiquei sabendo que um dos meus grandes e fiéis amigos quase tinha sido uma das vítimas do acidente. Só aí que, efetivamente, a minha casa caiu. Dei-me conta do quanto as pessoas são importantes na vida de outras pessoas. E quando um acontecimento destes nos afeta diretamente, damos muito mais valor à vida e aos familiares e amigos.

Meu amigo é Franscesco Silva, repórter da RBS TV de Chapecó. Ele e seu colega Evandro Troian, repórter cinematográfico, estavam indo cobrir o acidente. Foram conversando, como dois grandes amigos. Lá no local, trabalharam e ajudaram a resgatar as vítimas. Ao final de uma entrevista que Franscesco e Evandro realizavam, o Franscesco viu o caminhão desgovernado que vinha na direção deles. Ele só teve tempo de se atirar para o lado. Sentiu, há menos de um metro, o caminhão passando furiosamente. E, quando o caminhão passou por ele, teve o microfone arrancado de sua mão. O destino do amigo e colega Evandro não foi o mesmo. Ele foi arrastado pelo caminhão e morreu na hora.

É nessas horas que eu fico pensando sobre a brevidade da nossa vida. “Basta estar vivo para morrer”, como as pessoas dizem por aí. E também basta estar vivo para extraordinariamente continuar a viver, como um novo respiro que é oportunizado por Deus. Como meu amigo disse: “Agora tenho duas datas de aniversário”. E é nessas horas também que a gente se dá conta de que o mais admirável na vida não é ter grana, status ou um trabalho chique. O importante é ter com quem contar, é ter com quem conversar, é ter quem amar. O formidável pra mim, como lição de vida neste acidente, é saber que as pessoas têm um valor inestimável na vida de outras pessoas, como o Franscesco tem valor na minha vida (às vezes é preciso acontecer uma coisa triste para que as pessoas encontrem tempo para saírem de seus cotidianos corridos e pararem para pensar, para se falar e para se abraçar).

O segredo da vida é aprender que algumas coisas com as quais as pessoas se empenham têm pouco valor, ou quase nenhum quando a “brevidade da vida” se apresenta. Nessas horas o que vale mesmo é ter a consciência de que a vida física é passageira. E precisamos dar muito mais atenção às nossas atitudes enquanto seres humanos serenos do que enquanto consumidores de utensílios perecíveis da vida.

9.10.07

A história da cadelinha

Agora tenho mais um novo empreendimento (para desespero de meus pais) que se chama Beterraba Filmes e é uma produtora que trabalha com vídeo. Pois no último sábado a equipe da produtora viajou a Gramado para executar um trabalho. E, entre bilhões de cenas, uma era gravar uma porta de entrada com um senhor recepcionando as pessoas. Posicionamos tudo: tripé, câmera, mini-grua e mais o diabo a quatro. Na hora de gritar o “gravando”, vem um senhor com uma filha e uma cadelinha. Era uma cadelinha simpática, toda enfeitada, com uma “xuxa” no cabelo. Eis que o cara, do nada, prende a cadelinha na porta e entra no lugar.

Toda a equipe ficou se olhando. Não tinha como gravar com a cadelinha pendurada na porta bem faceira. Então, fomos lá, desenrolamos a guia da cadelinha e passamos para um componente da equipe segurar. Eu e mais uma outra colega estávamos de figurantes, ou seja, nosso papel seria entrar na porta enquanto a câmera gravava. Com uma cara simpática nós seríamos recebidas pelo recepcionista.

Bom, nosso colega segurando a cadelinha, gritou o novo “gravando”. Eu e minha colega “desfilaríamos” entrando na tal porta, sendo recepcionadas pelo cara. Quando estávamos quase terminando a gravação, a cadelinha se solta e sai correndo. No meio da cena entra o nosso colega a mil atrás da cadelinha. Eu e a minha colega de cena tivemos que parar de encenar para sair correndo atrás da cachorrinha. E ela queria fugir, e nós em quatro atrás dela.

Quando enfim conseguimos segurar a cadelinha, precisamos acalmá-la. Seguramos ela no colo para gravar o resto da cena. Depois, a colocamos no mesmo lugar e o recepcionista ficou conversando com ela. Mais tarde foi a minha vez de bater um papo com a cadelinha. Fui lá dizer pra ela ficar calma que a família dela, dentro de alguns minutos, estaria de volta. O bichinho começou a me lamber carinhosamente.

Quando a família da cadelinha chegou, ninguém teve coragem de contar para os donos que a cadelinha quase havia fugido porque nós a desprendemos. Ficamos lá, com cara de tacho, olhando pro chão. Já que a cadelinha não falava... a gente é que não iria contar. Fui perguntar o nome do dog e descobri que era a Lilica. E ela tinha bem cara de Lilica, enfeitada daquele jeito.... Fizemos mais uns carinhos nela, conversamos com os donos e eles foram embora. Todos ficaram se olhando com cara de remorso, até o recepcionista.

Viemos rindo até chegar em casa. Mas ao mesmo tempo em que ríamos, ficamos com pena da cadelinha, apesar de não ter acontecido nada. No meio do caminho minha irmã me liga: “Oi Robes, me diz EXATAMENTE a hora que tu vai chegar em casa”. Eu, bem inocente, disse: “Lá pela uma da madrugada”. Quando, passado da uma hora eu cheguei em casa, descobri que a minha gata Lisa havia realizado seu grande sonho: pulado para o andar abaixo no vizinho. Ela pulou num vizinho e, naquelas alturas do campeonato, foi salva por outro vizinho. Era madrugada e ela não estava em casa. De tão brava que a gata estava, minha irmã não conseguiu trazê-la pra casa, e ela estava escondida embaixo de um móvel do vizinho. Na hora caiu a ficha da ligação da minha irmã. Depois descobri que foi uma função: todo mundo querendo minimizar o fato da fuga da Lisa para eu não me apavorar. E aconteceu mais ou menos como a cadelinha: Como a Lisa não fala, eu não sei o que aconteceu, porque todo mundo me conta uma história diferente... Mas o caso é que a Lisa conheceu o mundo que ela tanto queria conhecer.

Acho que foi a vingança da cadelinha...

30.9.07

Povo!

Acessem o blog novo da Biba. É esse aqui, ó:

http://www.scriptografias.blogspot.com/

Mas acessem mesmo!


E tem o blog novo do Pablo Corazza... esse já faz uns dias e esqueci de postar aqui, então, aí vai:

http://www.resenhasdebanheiro.blogspot.com/

O blog mais contestador de Passo Fundo. Se eu fosse tu clicava pra conferir.

24.9.07

Para os loucos por animais!


Duas histórias: a do Bolacha, um vira-lata louco de lindo. E da branquelinha Poodle Toy.

É o seguinte: O Bolacha é esse cachorro que tá na foto. Ele vive pelo centro e se apaixonou por uma senhora, cozinheira do REstaurante Popular. Só que a cozinheira não ama o Bolacha. Então ele é obrigado a ficar do lado de fora do restaurante, passando frio e fome e, além de tudo, levando chutes... Ele já se machucou umas quantas vezes. Vejam o relato de uma senhora ativista dos animais (que já tem uns quantos em casa e cuida de Bolacha à distância):

"OI. O BOLACHA NÃO FOI ADOTADO!
INFELIZMENTE FUI FALAR COM A COZINHEIRA DO RESTAURANTE E ELA FOI MUITO GROSSA COMIGO, DIZENDO QUE NÃO ERA DELA, QUE O CÃO ESCOLHEU ELA, E QUE ELA NÃO ESCOLHEU O CÃO!!!
FAZ 3 DIAS QUE NÃO O VEJO, ME FALARAM QUE ELE ESTA ATRAS DE UMA CADELA NO CIO NO CENTRO DA CIDADE, MAS CONSTANTEMENTE ELE APARECIA NA FRENTE DO RESTAURANTE E DEITAVA ESPERAR ESSA MULHER, ERA CHUTADO, MALTRATADO E MESMO ASSIM FICAVA NA FIDELIDADE ESPERANDO ALGUEM QUE NÃO QUERIA ELE!
APARECEU MACHUCADO DUAS VEZES......."

Então, caso alguém com um pátio singelo fique sensibilizado com o e-mail desta senhora, entre em contato com este humilde blog pelos comentários, ou pelo e-mail santasaliencia@yahoo.com.br. Será um grande negócio adotar BOLACHA. Um cachorro lindo e fiel.


A branquela Poodle Toy

Uma cachorrinha branquinha, Poodle Toy, foi encontrada neste final de semana na frente de um prédio no centro de Passo Fundo. Ela estava há algum bom tempo naquela chuva incessante. A cadelinha, que não é castrada, apresenta indícios de estar perdida. Ela está bem cuidada, limpinha, tosada e com coleira no pescoço. Ela chora muito e parece querer ir para a casa, segundo a querida Dona Lurdes da Beta Vídeo.
Então, se você souber notícias de uma cadelinha perdida, entre em contato pelo santasaliencia@yahoo.com.br.

Aos que ajudarem, o céu!

21.9.07

A MÚSICA ARTE DE PASSO FUNDO

*Por Samara Kalil, com a colaboração de Natália Fávero.

Para você que pensa que em Passo Fundo só se ouve música instrumental em sala de espera ou nas praças de alimentação dos shoppings centers e que esta está ultrapassada, lave a boca com sabão! Garimpando, garimpando, chegou-se a um novo grupo chamado Sonopoiese, que prova, mais do que nunca, que a música instrumental tem vida aqui na terrinha.

Formado por cinco integrantes, o Sonopoiese reuniu identidades diferentes para fazer um som. O resultado é um instrumental de altíssima qualidade, apresentado recentemente no Teatro Municipal Múcio de Castro.

Os músicos Zé Ricardo (percussão, à direita na foto), Felipe Adami (piano, ao centro na foto), Gadiego Ribeiro (contra-baixo, à esquerda na foto), Vinícius Baschera (bateria), Giu Sanderi (saxofone e flauta), envolvem-se vinte e quatro horas por dia com música. Eles trabalham como professor universitário, músico de baile e de jeito algum querem deixar a música instrumental sumir dos ouvidos do público. Contudo, buscam espaço no cenário regional.


O SIGNIFICADO DO NOME

Em entrevista, Felipe Adami explicou o significado do nome do grupo através da palavra “poiese”, que se trata de produção ou criação de som. Ele diz que a “poiese” é usada não só na parte de criação musical, mas também na artística em geral. O “sono”, no caso, vem de som.


A CULTURA EM PRIMEIRO LUGAR

Apesar das complicações de abertura do mercado para o estilo, a intenção deles, além da satisfação pessoal, é também somar para a cultura da cidade e do país. Mesmo assim, Zé Ricardo conta que a música feita por eles não é algo fácil de o público assimilar. De acordo com o músico, Passo Fundo teria de ter a música instrumental mais fluente na vida das pessoas, principalmente com a vinda de outros grupos para cá.

Conforme Gadiego, Passo Fundo tem problemas de divulgação de cultura. “Existe aquilo que é comercial e as pessoas aceitam. Não se sabe que há músicos fazendo outras coisas”. O integrante do grupo destaca tal déficit, não só na área da música, mas também da literatura, da pintura. “Temos que tentar batalhar para deixar isso cada vez mais vivo, não deixar morrer, pois daí ninguém vai saber mesmo, que existem outras opções culturais além”.

AS PROGRESSÕES

De acordo com o grupo, reunido desde o início de 2007, já há o plano de tocar em outros lugares, como em Porto Alegre e Cascavel. Assim, com a iniciativa deles, em promover a música passo-fundensse, a cidade deixaria de estar isolada no estilo instrumental.

Quanto às produções, eles pretendem gravar em breve um CD com composições autorais. Até o momento já possuem duas músicas. Entretanto, tendo em vista as barreiras que a música instrumental enfrenta por aqui, eles ainda brincam: “se conseguirmos tocar uma vez por mês, agente já está mais que feliz”.


17.9.07

“Vou te contar o que comi hoje”!

Minha irmã Gabriela, a única que tenho, anda com umas manias esquisitas: ela precisa contar o que comeu. Tudo bem que andamos fazendo regime, então, como diria Mano Lima, “é na hora do aperto que a gente vê se o índio é bueno”. E nessas funções de reclusão alimentar, por assim dizer, Gabriela foi dominada por uma psicose, para não dizer doidice, que está quase me pegando. É mais ou menos assim: Ela chega em casa do trabalho, se atira no sofá, põe a mão no cabelo e solta:

- Ai, Robes, acho que comi demais hoje.

- Ah é? (minha frase feita).

- Sim. (e eu na moita, esperando.... e então lá vai ela:) Deixa eu te contar o que comi hoje?

- Tá, conta!

- (Ela se anima:) Hoje eu acordei, tomei um copo de iogurte, comi uma banana e bolachinhas salgadas.

- Muito bem...

- E tu, comeu o que?

- Um pãozinho de queijo e um café.

- Um pãozinho pequeno?

- Aham...

- Mmmm. Bom, no almoço eu comi aquilo que tu viu, né; uma colher de arroz, carne e salada. E tu?

- Também o que tu viu e o que tu comeu.

- Mas tu viu a quantidade que eu comi, né?

- Siiiim.

- Bom, de tarde não me agüentei e passei no mercadinho comprar uma paçoquinha. Não devia ter comido a paçoca! Garanto que estou um quilo mais gorda!

- Ai Gabriela, que saliência...

- E tu?

- Hoje excepcionalmente comi um chocolatinho.

- Mmmm. Bom, e quando eu cheguei em casa do trabalho tomei mais um copo de iogurte, e comi um sanduíche. E você? Jantou o que?

- Eu comi dois sanduíches.

- Dois?

- Sim, estava morrendo de fome.

- Será que agora eu posso comer uma maçã? Será que vou engordar?

- Sei lá, acho que não.

- Onde tu está indo?

- Pegar uma cenoura pra eu beliscar...

- Robes, tu come mais do que eu durante o dia, como tu não engorda?

- Eu sou mais fofolete que tu. Disso eu tenho certeza.... mas vou fazer o quê? Tô de regime, e mesmo assim está dando um bom resultado.

- E ainda assim come mais do que eu, e sou eu que engordo!

- Gabi, tu é muito atucanada... relaxa e continua com teu regime. Tenta caminhar também que ajuda! Mas não fica nessa atucanação, certo?

- Tá, não vou mais ser saliente. Mas será que eu posso mesmo comer a maçã? ...Não devia ter comido a paçoquinha hoje...

Respirei fundo e fui pegar um copo de água. Para nós duas.

15.9.07

Beterraba Filmes no Diário da Manhã

As histórias de Carlos Teston, Fabiana Beltrami, Leonardo Gobbi e Roberta Scheibe na Beterraba Filmes são destaque em reportagem de Fábio Rockenbach no jornal Diário da Manhã deste sábado. Vá na banca e compre. Agora!

11.9.07

Por falar em cinema...

tem blog novo na área. É de Passo Fundo, feito pelo estudante de jornalismo e repórter do jornal Diário da Manhã, Fábio Rockenbach. O endereço é http://porfalaremcinema.blogspot.com! Não deixa de conferir!

4.9.07

Cinema em casa
(é daí que surgem as fofocas)

Uma mulher briga com um cara. Ela está num porão. Ele parado em frente ao porão, segurando uma bicicleta. A irmã da mulher tenta acalmar os dois. Segura um de cada lado, em vão. As crianças choram! Elas espiam o acontecido por meio da janela da parte de cima da casa. O homem suplica para “voltar”. Ele permanece parado em frente ao porão, junto à bicicleta, sua fiel escudeira; acompanhado de uma mala, que permanece jogada na grama. De repente, a mulher se vira, olha para o prédio em frente, e grita:
- Virou atração do centro agora!?!? Vão dormir!
E eu era uma das duas pessoas xingadas pela mulher.
O fato aconteceu e juro de pés juntos que é verdade. Comecemos do princípio, para reinar a redundância (afinal, o mundo é feito delas)...
Estava eu no vizinho, assistindo ao novo filme do Wim Wenders, Estrela Solitária. De repente, olho pro vizinho e digo:
- Escuta só, tem alguém discutindo.

Então ouvimos um barulho de algo sendo atirado ao chão, tipo uma panela; seguido dos gritos de “sai daqui!!!”, com muita fúria. Aquele “Sai daqui!!!” de voz aguda e penetrante. Corremos para a janela. Vimos uma mulher com os cabelos alardeados pelo fogo do momento. Em resumo: estavam um tufo. A casa onde ela fazia o espetáculo tem dois pisos. Em cima sala e quartos, embaixo porão. E ela estava no porão (um porão equipado). O cara que ela xingava permanecia calmamente levando tapas parado ao lado de sua bicicleta. Mais chaleiras voaram. Então o homem pegou a bicicleta e foi embora. A mulher continuou xingando. Foi então que nos viu na janela e proferiu o xixi.

- Virou atração do centro agora!?!? Vão dormir!
Meu vizinho largou num sussurro:
- Mas como, com esse barulho?

Nossa curiosidade foi maior do que a discrição permite. Desligamos as luzes da casa e fomos espiar por uma outra janelinha. A mulher empurrava os filhos para dentro de casa:

- Entrem! Entrem!

- Não mãe! Quero ficar aqui! – dizia um gurizinho de uns quatro anos.

- Já falei pra entrar!

Os filhos entraram. Não havia a menor possibilidade de conversar com a mulher. Os pais dela limitavam-se a dar uma espiada na janela. E ela lá embaixo, feito uma onça! Gritava, jogava coisas, bufava. Se fosse desenho animado sairia fumaça e poeirinha do porão. Dali uns minutos volta o cara de bicicleta. A mulher se esconde. Descompõe o cara permanecendo escondida.
Ele, pacientemente, pega a mala e senta em cima dela. E espera. Como ela não abre, ele guardou a bicicleta na escuridão, camuflou a mala atrás de uma árvore-capim e deitou ali. Fez da mala seu travesseiro. Já fiquei com pena do cara, apesar de que todos os indícios mostravam que ele era o cafajeste da história.

O show aparentemente havia terminado. Voltamos ao filme. A cada pouco se ouvia um grunhido da mulher. Fui pra casa. Ao deitar, escutei ela:
- Não vai ir embora?
Deu mais umas bufadinhas e caiu no cansaço. Eu também. No outro dia, quando acordei, olhei para a casa. Ela estava silenciosa. A mãe da mulher lavava a calçada quieta. As crianças não brincavam na rua como todos os dias. Uma mulher – a irmã, que tentava apartar os briguentos – estava murcha, sentada a um canto olhando para o nada. De tarde, ao sair de casa, passei pela frente do porão (é o meu caminho diário). Vi que as coisas voltavam a se arrumar por ali. Fiquei com medo de encontrar a mulher brava, mas, ainda bem, ela não estava ali. Talvez estivesse no quarto, remoendo o espetáculo e o amor. E eu a espiada.

3.9.07

Marginal (?)

Por Pablito Tavares


O caminho é fugir do mainstream. Viver à margem. Cobrir tudo que é tipo de assunto por uma perspectiva diferente. Mas será que estamos preparados para tanto?

Não sei. Tem muita gente ainda que eu conheço “da facul” que ainda sonha em estar na bancada do Jornal Nacional, imitando o Clodovil nos intervalos, ou cobrindo alguma visita de algum ator famoso na Ilha de Caras.

Mas, claro, tem gente preparada, sim. Gente que não quer mais saber. Não quer mais esperar pelo “sonho-de-trabalhar-num-grande-conglomerado-de-mídia”. E qual a solução? Internet, baby!

O blog, hoje em dia, ganhou a projeção do que seria a reedição d’O Pasquim nos dias de hoje, só que mais nerd (hehehe). Jornalistas tidos como “fodões” estão saindo desses conglomerados de mídia para escreverem sobre o que querem. Ou melhor; alguns até USAM desses meios justamente pare este fim. Como o Ricardo Noblat, que tem seu blog sediado no portal Globo.com. Meeestre.


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Cansei. Não de ser sexy, como a banda (superestimada, por sinal), mas de procurar, procurar e encontrar as mesmas coisas em tudo quanto é lugar, seja jornal, revista, grandes sites, TV, rádio, folheto de loja e papel higiênico. Em todo grande site hoje (manhã do dia 17 de agosto) há uma notícia em destaque sobre o terremoto no Peru, sobre a queda das bolsas de valores, com um destaque para a estréia do filme d’Os Simpsons. Cansei, cansei.


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Fiz recentemente uma badtrip ao mundo d’ O Pasquim. Li a Antologia vol. 1 e a tese de mestrado da prof. Sônia Bertol sobre Tarso de Castro. “Me abri” para as idéias dos caras, no pior vocabulário chulo. Como os caras conseguiam fazer uma coisa extremamente crítica se tornar engraçada? Era a época, o contexto cultural ou o corte de cabelo?

Como “resgatar” este período, como muitos pregam? Talvez pelos blogs, como já escrevi anteriormente, ou pelo Jornal A Vara, ou até mesmo na revista piauí.


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Mas, às vezes, acontece o inverso. No intuito de ser um Tarso do século XXI, muitos acabam cometendo o mesmo erro dos veículos mainstream. Não é raro encontrarmos coisas iguais em muitos blogs diferentes.



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Pra ser sincero, não sei se todo mundo deveria seguir esse caminho alternativo. Acho que existem muitos que deveriam seguir pelas “estrada para Mandalay”, rumo ao seu destino global, e deixar o marginal para os verdadeiros marginais. Alguns não merecem tanta nobreza. Que deixem o cadáver de Tarso em paz.

29.8.07

A arte da leitura

Termina sexta-feira, 31 de agosto, a 12ª Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo. Isto caso você esteja lendo o jornal no dia de sua circulação. Caso contrário, já terminou. Ou está terminando. Este ano a jornada trata do tema A leitura da arte & A arte da leitura.

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Na abertura do evento o público recebeu com surpresa e satisfação o nome do autor ganhador do maior prêmio literário do Brasil. Mia Couto, moçambicano (ele é homem!!!), levou a bolada de 100 mil reais com o romance “O outro pé da sereia”.

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Antes disso, nos “discursos”, as autoridades, entre elas a organizadora das Jornadas Tânia Rösing, o deputado federal Beto Albuquerque e o deputado estadual Luciano Azevedo, lamentaram o cancelamento da verba que a jornada receberia com o aval do Conselho Estadual de Cultura do Rio Grande do Sul. Tramita no conselho um “parecer” que questiona o uso de verbas do evento.

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Na terça-feira à noite, a discussão no circo da cultura foi sobre arte & entretenimento. Participaram Maurício Dias da TV Senado, Lúcia Araújo da TV Futura, a escritora Marina Colassanti, o escritor vencedor do prêmio Jabuti Flávio Carneiro, e o escritor, compositor e produtor musical Nelson Motta. Eles defenderam que entretenimento também pode ser arte, que a arte pode transitar por todas as camadas sociais e que o entretenimento também pode ter um valor estético e conceitual. Aproveitaram a oportunidade para falar mal de Paulo Coelho. Nelson Motta pegou o ganho e disse que Paulo Coelho vende muito no exterior e que lá os livros são sensacionalmente mais bem escritos do que no Brasil. Pelo jeito o tradutor deve ganhar uma grana...

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Paralelamente à jornada acontece o curso sobre o jornalista passo-fundense Tarso de Castro. Ele foi o fundador, editor, repórter e entrevistador porra-louca do Pasquim. Depois disso fundou e trabalhou em vários jornais brasileiros. Entre eles o Jornal de Amenidades, o Já e o Jornal O Nacional do Rio de Janeiro, que chegou a vender um número expressivo de exemplares na terra de Chico Buarque. O jornalista também ajudou a criar a Ilustrada, caderno de cultura do Jornal Folha de S. Paulo, e também foi colunista deste mesmo veículo. Tarso amava mulheres, bebidas e jornalismo. Foi amado e odiado. E o curso tenta fazer justiça a um personagem quase esquecido por boa parte dos cidadãos de um Brasil de memória curta.

* * *

Pra terminar, numa dessas noites, eu sentada numa cadeira, embaixo da lona da jornada, prestando atenção na conversa proferida pelos oradores. Minha tia, Maristela, que pela primeira vez participa do evento, me puxou pro lado e cochichou:

- Tu já pensou se cai esse troço aqui?

- O que tia? Você tá falando da lona?

- Sim!

- Mas não vai cair, tia.

- Mas e se cair??? Todo mundo vai ficar preso embaixo desse negócio. Acho que amanhã vou trazer uma tesoura.

- Então tia, aproveita e traz uma de ponta.

27.8.07

Jornalista de alma!

Como diria meu mestre João Carlos, o jornalista "Tarso de Castro era um homem de copo e vara em punho". Eu acrescentaria ao copo e a vara o jornalismo alternativo. É por isso que a 12ª Jornada de Literatura deste ano justamente vai homenagear o jornalista prata da casa Tarso de Castro.

O curso “O Brasil de Tarso de Castro: a arte da leitura & feitura de O Pasquim”, vai abordar a trajetória do profissional que revolucionou o modo de fazer jornalismo no Brasil desde o final da década de 60. Tarso de Castro foi o pai d’O Pasquim, da revista Careta, do Jornal de Amenidades, do jornal O Nacional do Rio de Janeiro, O Panfleto, entre tantas outras publicações. Ele também participou do caderno Ilustrada, e foi colunista do jornal Folha de S.Paulo.

O evento terá a participação de pesquisadores, professores e jornalistas, entre eles Ziraldo Alves Pinto, Mauro Gaglietti, Francisco Carlos dos Santos Filho, Marta Campos, João Carlos Tiburski, César Augusto Azevedo dos Santos, Daniel Bittencourt e dos pesquisadores e biógrafos Tom Cardoso e Sônia Bertol.

“O Brasil de Tarso de Castro” vai analisar as obras “O melhor d’O Pasquim” de Jaguar e Sérgio Augusto, da editora Desiderata; e as obras dos participantes do curso Tom Cardoso, com o livro “Tarso de Castro: 75 Kg de músculos e fúria”, da Editora Planeta; e o livro da professora Dra. Sônia Bertol, “Tarso de Castro – o editor de O Pasquim”, da UPF Editora.

A homenagem a Tarso de Castro realiza-se de 28 a 31 de agosto, na sala 204 da Faculdade de Artes e Comunicação, na Universidade de Passo Fundo (UPF). Este evento acontece paralelamente a Jornada Nacional de Literatura que inicia hoje.

24.8.07

A dança e o parto

Ana Maria da Rocha

Barulho de objetos caem sobre o metal. O cheiro de álcool entra pelas suas narinas. Algo impede o movimento do seu braço. Sara recorda onde está. É muito cedo, o que implicaria num dia longo demais e isso ela não quer, decide fingir que está dormindo. Teria enganado qualquer um, exceto o seu acompanhante. Davi gabava-se, em família, de ser o único que a irmã não enganava. Bom dia, bicho preguiça! Como resposta um resmungo abafado pelo lençol. Por que as pessoas costumam tratar os doentes dessa forma infantilizada? Por mais que tentasse não conseguia mais manter os olhos fechados, as abomináveis fadinhas da luz vinham forçar suas pálpebras e nem os tapas, que certamente atingiram uma ou outra, serviram de argumento para espantá-las. Enfermeira Laura compareça ao Posto 4. Doutor Ricardo, doutor Henrique está lhe aguardado na sala 15. Esfregou bem os olhos para que não sobrasse nenhum vestígio de sonho. Coisas que sempre estão no ar e a noite desabam sobre os lençóis. As vozes que a atormentavam nas noites da infância voltaram... talvez ela ainda seja criança e tenha sonhando ser gente grande - isso justificaria o tom de voz do irmão. Isso! Ela é só uma princesinha em sua cama rosa, rodeada por sua corte de bonecas de porcelana. Fecha os olhos.

Faz sol, da cozinha a mãe ri vendo a filha correr atrás da própria sombra, tentando capturá-la, entre passos de balé. Essa menina tem cada idéia. Depois do almoço é a hora de fazer preguiça. Sara arrasta o irmão para fora e deitam-se sob o sol, brincam de descobrir objetos e animais e até criaturas imaginárias no formato das nuvens. Eu queria que as nuvens fossem de algodão doce. Quando come algodão doce Sara fica lambuzada até as orelhas. Por que? Pergunta o irmão que prefere picolé. A mãe não disse que o papai tá lá do céu? Então, ele podia comer algodão doce e lembrar de mim, daí não ia se sentir sozinho.

A enfermeira volta com o café da manhã. Diz que a cirurgia foi marcada para a tarde do dia seguinte. Davi insiste para que ela coma alguma coisa, está muito magra. Ela ri e diz que o câncer foi a dieta mais eficiente que já fez. A comida do hospital enoja-a e ela não acredita na higienização daquelas xícaras e talheres. Pede uma maça. Lembra das dentadas que deu na maça que a serpente lhe oferecia no sonho. Contou para o irmão, riram juntos. Nunca fora uma boa cristã, dos sete pecados capitais não teve um que não cometesse. A tia Letícia rezaria dobrado pela minha alma se soubesse! O médico entra para examiná-la, insiste que ela tem boas chances. Sara sabe que está mentindo, sempre que as pessoas insistem em algo é porque estão mentindo. Quando fala a verdade, a pessoa acredita-se suficientemente convincente e fala só uma vez. Mas quando mente, reforça a idéia para tentar convencer a si mesma do que está dizendo.

Mãe me leva no circo, tem palhaço, elefante e maça do amor. Mãe se duas pessoas mordem a mesma maça do amor ficam apaixonadas? A menina imita a bailarina que aparece na televisão. De onde tu tirou essa idéia guria. Tua imaginação não tem limites. Chove muito lá fora e Sara está na janela namorando o temporal. Tinha medo, mas o vento fazia a chuva dançar tão bonito. Mãe, eu quero dançar que nem a chuva! Mas a noite quando os galhos arranham o vidro da sua janela, puxa a coberta e chama seu exército pessoal, mãe, irmão e cachorro, para defendê-la. Por que a noite tá chorando e o vento geme desse jeito? Ela acredita que é só chorar um pouquinho e todos os seus desejos são atendidos e que se chamar a mãe a dor passa.

Mãeeeeeee! O irmão que tinha cochilado na cadeira, acordou com o grito. Já era passado do meio-dia, Sara suava muito e estava febril. Davi achou melhor chamar a enfermeira. Quando voltou para o quarto encontrou-a aos prantos. Afinal admitia que tinha medo! Amanhã daria a luz à um tumor que, ironicamente, alojara-se onde ela nunca permitiu que nenhuma forma de vida se desenvolvesse. Já, esta forma de morte, não teve como evitar. Como seria seu primeiro e último parto, ela, por carinho ou masoquismo batizou o tumor de Miguel, o nome do filho que nunca teve. Apesar de acreditar-se dotada do dom da premonição, ela não sabia que sairia dali. Que voltaria a dançar e encontraria o Antonio numa revisteira e tomariam um café e os sentimentos... os sentimentos até então represados, transbordariam deixando-os encharcados.

Na faculdade, seus olhos castanho esverdeado somados a pele quase negra, garantem que não passe despercebida, mas é um tanto quanto difícil, dizem seus namorados que não permanecem no cargo mais que um mês. Cursa o quarto semestre de Letras, quando vai pela primeira vez ao quarto do Antonio. Onde descobre o sexo dos anjos, porque os anjos têm sexo sim. Simultaneamente, dança em um grupo amador, adora balé clássico mas não se encaixa no perfil das bailarinas do teatro municipal, é grande demais, ossuda demais, escura demais. A menstruação atrasa, ela não quer o filho, esconde do Antonio. É convidada para dançar numa companhia no exterior. Antonio terminou a faculdade de Direito e passa num concurso público. Ela dança em Los Angeles, sem anjo nenhum. Ele em Curitiba com uma dançarina de um clube noturno.

Sara no palco magnetiza. Os homens caem, literalmente, aos seus pés. Tem um que adora lamber a sola suada do seu pé depois de cada apresentação. Outro, não conto! Mas colo, com direito a carinho e sossego ela só encontrou no peito de dois homens e um era seu irmão e outro seu amigo. Os homens que têm só lhe trazem angústia e a sensação de inadequação. Sempre atiram em sua cara que seu jeito de amar está errado. E como se deve amar?! Berra dentro de um restaurante elegantíssimo. Ela era sempre demais. Louca demais. Passional demais. Indiferente demais. Vibra demais. Certinha demais. Tensa demais. Nunca boa demais. Minto teve um que disse que ela era boa demais. Mas foi uma daquelas histórias que os homens contam quando traem suas mulheres e não conseguem mais conviver com a consciência culpada, daí inventam desculpas para passar a responsabilidade do fim para elas.

Anoitece e ela não para de indagar o irmão. Ele já havia traído? O que tinha de errado com ela? Por que não conseguia levar a vida fácil como a maioria das pessoas? Uma mentira dita mais de mil vezes, vira verdade? Mentiras sinceras interessam mais? Por que o Antonio não percebeu o quanto ela o amava? O irmão achava que aborto era crime? O câncer era um castigo? Existia inferno? Sara transpira excessivamente. Fecha os olhos. Onde está a mamãe? Quem vai me dar colo? Cadê o meu filho? Quem quebrou a minha boneca? Mãe, olha esse passo, fiz direito? Davi preocupa-se, pensa que ela está delirando.

Dia quinze de junho completou trinta e cinco anos. Não comemora. Os exames que a ginecologista pediu indicaram a existência de um tumor no seu útero e em estágio avançado. Sara acredita que produziu ele da mesma maneira que fabrica suas enxaquecas. Lembra que faz muito tempo que não come algodão-doce e nem maça do amor, estava amarga demais. Magoa as pessoas a sua volta, umas para não confessar sua fraqueza e a dependência, outras para que sintam menos a sua falta. Era o fim, morreria de culpa, remorso, castigo divino expresso na forma de um câncer.

Acaba de entrar na sala de cirurgia. Pede para ser cremada. Para que suas sapatilhas sejam jogadas ao mar num dia de tempestade. Confessa que foi ela que arrebentou as cordas do violão que Davi ganhou no natal de 74. E que ama o Antonio. Mãe me cuida. Tenho medo. Filhinho não chora já estou indo. Ela reza baixinho.

22.8.07

O de sempre

Por Luis Henrique Boaventura

Atravessa a rua debaixo de uma chuva torrencial. Como um peixe, rasgando a correnteza brava fisgado pelo anzol brilhante do velho letreiro de néon. Entra num bar qualquer, num bar que nunca havia entrado na vida. “O de sempre”, diz ele, enquanto se livrava da água como um cachorro molhado. O barman nunca o tinha visto, mas percebeu a total falta de senso do homem. Serviu um scotch duplo. Não diria nada. Em primeiro lugar, porque não queria um conflito em vão. Depois, porque não tinha a menor inclinação a qualquer tipo de caridade. Já que se nem percebera que aquele não era o lugar que freqüentava, certamente não perceberia ou sequer sentiria o gosto da bebida. Talvez, como qualquer outro, ao menos uma vez na vida, precisasse apenas de algo forte para queimar sua garganta. Para dar-lhe a certeza de que, apesar de todas as fortes evidências gritando o contrário, permanecia vivo. Nunca valeu a pena ao barman se interpor entre um homem e seu copo. Mas não... aquele levou a boca à bebida, e não o contrário. Parecia querer mergulhar nela, prevendo exatamente o sabor redentor que o esperava. No entanto, sentiu o aroma clássico, a suavidade decepcionante de um uísque impotente frente àquela língua calejada de destilados. Sentiu que não era o que bebia sempre, nem o que pagaria para beber. Se tivesse tal intenção, de qualquer modo... Olhou para o chão montado de parquê escuro, coberto pelo grosso tapete de poeira e bitucas de cigarro. Deu uma boa olhada naqueles rostos inéditos que se camuflavam entre as sombras plantadas pelas altas horas de um domingo à noite, no terreno árido das mesinhas de fundo. Respirou aquele ar diferente, carregado de fumaça nacional e nicotina nativa, quase edificante, quase estranha, tão densa que poderia ser capaz de produzir paladar ao invés de aroma. Olhou para um rádio antigo que conversava em letargia com o acaso, escondido no balcão alto da esquerda, junto aos vidros de pepino, preenchendo cada canto, cada fresta de parede e de telhado com um silêncio de sentidos e um carnaval de estática. Havia pegado a primeira e não a segunda à esquerda depois da igreja, provavelmente. Enfim percebeu, sem que precisasse de qualquer palavra do barman. Sabia beber, mas não era capaz de andar, pensar ou sentir sozinho. Quase puxou o revólver ali mesmo...

“Por que o senhor não se senta? Senta aí, pega um banco”. Bastaram alguns segundos para que o barman se arrependesse. Mal sabia que salvara a vida do homem. Ou que a condenara por completo... Ele respondeu com um olhar para o teto avermelhado, com as mãos que se desprendiam do gatilho frígido do revólver e se revelavam sobre os bolsos da jaqueta de couro de uma década de idade. Alcançou um daqueles banquinhos duros e sentou. Arremessando seus braços cansados sobre balcão, e erguendo com dificuldade os olhos em direção ao barman, pediu absinto. O tal do barman aparentava uns sessenta, sessenta e cinco anos. Não devia ter mais de cinqüenta, mas estavam estampadas nas linhas fortes do seu rosto centenas e centenas de noites de domingo como aquela. Cada uma delas o envelhecia uma semana. O homem, por sua vez, aparentava já estar morto. Teria uns trinta e cinco, soando bem generoso. Já a garrafa de absinto parecia anterior aos dois. Envolta pelo manto de uma poeira grossa que cobria o verde intenso da bebida. A criptonita de qualquer homem.

Ela é virada de vagar, como se vira uma mulher com cuidado para não acordá-la. As primeiras gotas fogem pelo lado torno da garrafa. Podia-se vê-la explodindo ao atingir o fundo do copo, iluminava quase o bar inteiro, acompanhada pelos trovões distantes da tempestade que se afastava. O barman nem havia terminado de enchê-lo quando o homem pegou-o de repente do balcão. Olhou a bebida fixamente. Seduzindo-a, conquistando-a, bebendo-a primeiro com olhos, para só depois tragá-la sem culpa alguma. Nem chegou a tocar o copo com os lábios, jogou o verde fósforo corrosivo direto na garganta, cortada, aberta pela ardência furiosa que o libertava. Era como se um desejo masoquista retido e uma pequena parte de sadismo tivessem sido derretidos, destilados e dissolvidos no fundo daquele copo. Como ele mesmo. Sobrado no fundo do copo, olhando para a cara assustada do barman de baixo para cima, como se fosse disparar algo ou ele próprio contra alguém. E talvez fosse mesmo, caso um tal de Roberto não tivesse resolvido entrar entre os dois no meio da noite...

“Meia-noite em ponto! Eu sou Roberto Cavalcante e este é o Madrugada Ao Vivo. Chove muito lá fora...”. “Desculpe, já passa da meia-noite, e eu preciso fechar o bar”, diz o barman, fingindo constrangimento, aproveitando a deixa do rádio que em vinte anos esquecido entre os vidros de pepino finalmente servira para alguma coisa. “Mas pode beber essa aí, eu vou fechando as janelas e dando boa noite ao pessoal”. Os homens ao fundo do bar, que compunham “o pessoal”, amigos do barman pela mera ocasião de precisarem de um lugar onde pudessem deixar suas vidas do lado de fora, não passavam de cinco ou seis. Não dava pra saber ao certo, já que uns pareciam homens, outros, apenas sombras de homens. Do que foram, e do que poderiam ter sido. Ele sorve a bebida lentamente, absorvendo-a como uma esponja, enquanto os observa sentados ao fundo com um olhar que esconde certa familiaridade. Parecia, pela ironia do engano, ter enfim encontrado um lugar que poderia ter sido feito dele mesmo. Cada tijolo, cada peça de parquê, exalava seu cheiro.

Os outros iam afastando cadeiras e lançando moedas sujas às velhas mesinhas condenadas pela umidade. O barman já contornava o balcão para o lado de dentro cobrando o homem... “São quatro pelo uísque e cinco pelo absinto”. Mas ele fixa seus olhos no balcão. Parecia tê-los perdido por ali. Demora alguns segundos, mas responde. “Preciso contar uma coisa”. Os pés do barman o carregam dois passos atrás, enquanto as mãos ainda se apoiavam com força no balcão. “Eu vou matar um cara”. A resposta do outro foi imediata. Talvez nem fosse uma resposta, talvez estivesse apenas enganando a si mesmo para encobrir com palavras repetidas o que acabara de ouvir. “Olha, eu não quero saber. Por favor, são quatro pelo uísque e cinco pelo absinto. E vamos logo que eu tenho que fechar o bar...”. Mas ele, de repente, não ouvia mais. “Eu nem sabia que era capaz de sentir tanto ódio”. Deixou escapar uma risada no final da frase. Algo no limite entre o sarcasmo do desespero e um possível sadismo, uma satisfação antecipada pelo que estava prestes a fazer. O barman já tateava entre as garrafas de baixo do balcão por um velho 38 nunca usado...

“Ele quer que eu faça uma coisa, mas eu não vou... Não era pra eu estar aqui, eu nem sei o que estou fazendo aqui. Foi ele, ele quem me pôs aqui”. O Barman já tinha ouvido histórias, mas depois dos primeiros anos, não prestava mais atenção. Poderia prever o final de cada uma delas pela primeira frase, e todas, sem exceção, terminavam no fundo de um de seus copos. Mas teve a curiosidade fisgada desta vez, depois de tanto tempo. Esqueceu do revólver debaixo do balcão, e deixou que ele falasse... “Aquele sádico maldito... Quem ele pensa que é? Acha que pode controlar tudo, acha que sabe tudo sobre mim, tudo sobre você... Ele não sabe NADA!”, gritara ele pela primeira vez. Mas o barman não percebeu, estava mais interessado no sentido daquelas palavras pronunciadas sob efeito anestésico que no volume que de repente rivalizava com Roberto Cavalcante.

“Era pra eu me matar, aqui, na sua frente... Mas seria assassinato, não? Ele estaria me matando”. Visivelmente bêbado, já não distinguia muito bem o que falava. “Eu não estou bêbado!”. Sim, está. “Desgraçado!”. Cala a boca. “Eu vou te matar!”. Ele salta do banco e tenta puxar o revólver, que inexplicavelmente, fica preso no bolso da jaqueta ao mesmo tempo em que o tambor se abre, derrubando todas as balas. O Barman o observa atônito, e percebe que o melhor é acabar com o sofrimento de um pobre homem atormentado e sem expectativas... “Não!” – diz o coitado, numa tentativa vã de intervenção – “Ele não pode te controlar, não o ouça!”. O barman fica inerte por alguns segundos. Certamente imaginando de que modo poderia mata-lo de forma rápida e sem sofrimento. “Não, eu nunca matei ninguém”, diz o barman, que a propósito, fora assassino de aluguel na sua juventude. “É mentira! E eu tenho quarenta e cinco, posso parecer mais velho por causa do bigode”. Você não tem bigode. “Claro que tenho”. Eu não disse que tinha.

“Sim, tem! Eu estou na frente dele e digo que ele tem! Você nem sabe o nome dele, nem o meu... Fica com essa frescura de ‘homem’, ‘barman’”, dizia Alfredo, entre as mesas, enquanto Arnaldo continuava estático atrás daquele balcão. “Eu nunca tinha ouvido antes... Nunca tinha percebido essa voz, essa maldita voz na minha cabeça...” – Alfredo pausava sua fala com socos verticais desferidos furiosamente contra as velhas mesinhas. Arnaldo mantinha-se da mesma forma, quase como se estivesse economizando oxigênio, como se quisesse fazer seu coração parar de bater. – “Não, não está só na sua cabeça, eu o ouço também, disse que estou tentando me matar” – Não disse isso – “Se meu coração parar de bater, eu morro, pra mim é a mesma coisa” – Não, eu falava de modo... – “Mas se esse alguém está agora descrevendo tudo isso, quer dizer que fui controlado minha vida inteira?”, “É o que me perguntava enquanto bebia aquele absinto. Droga, eu odeio absinto...”. Não me interrompam! Vocês acham que existiam antes de eu me sentar aqui e começar a escrever? Eu criei vocês, dei-lhes uma memória e características para que pudessem figurar nesta página. Vocês não têm sentido algum fora daqui. “É mentira, é tudo mentira” – Arnaldo bradava, atropelando Roberto
Cavalcante, agora tímido e inofensivo em sua caixinha de madeira – “Eu tenho duas filhas”. Não tem. “Tenho, lembro delas hoje de manhã”. Lembra, mas não tem. “Eu sei que tenho, você não vai me convencer do contrário”. De qualquer modo, se tinha, não tem mais, porque vou criá-las e matá-las no próximo parágrafo. “Não!”.

Um grito. Um tiro. Alfredo esboça um sorriso cínico, posso vê-lo se aproximando do balcão. Sim... agora vejo a arma claramente. Arnaldo permanecia com as mãos fincadas sobre o balcão, como estacas. Mas espere... Duas gotas de um vermelho vibrante contrastavam mergulhadas no copo de absinto. Arnaldo cai, lentamente. Ou tudo parece mais lento...? Alfredo tirava o revólver do bolso furado da velha jaqueta, vangloriando-se em silêncio por ter aproveitado uma tola... distração... para recolocar ao menos uma das balas no tambor.

As teclas ficaram vermelhas de repente... Meus dedos estão rígidos... As letras, elas dançam, dançam na minha frente... “Eu sabia. Você não passa de mais um personagem, criado e controlado como eu. Estava na cabeça do Arnaldo, estava na minha...” – Não é verdade... Eu imaginei você. – “Por que não desviou, por que não controlou isso? Sabe porquê? Não passa de uma voz na minha cabeça! E que não cala a boca, que não cala boca!!!”

Duas... Havia duas balas no tambor... Irônico, no entanto, que ao cair ele tenha derrubado sobre si a garrafa de absinto. Acho que fui picado por alguma coisa... Mas eu consegui, afinal... Estava planejado, estava escrito, ele não tinha escolha. Desde que pisou neste bar e foi salvo pela boca grande do barman... Estranho... Ouço teclas, muitas teclas, vindas de algum lugar... Sim, está claro agora, é dos pepinos, no balcão alto da esquerda.

Enxergo com dificuldade. O teclado parece um imã forte. Um travesseiro de penas me convidando para um sono tranqüilo. Minha cabeça pesa uma tonelada, gravitando em torno destas letras pequenas, nas palmas das minhas mãos. Ao menos eu pensava que estavam... Mas preciso resistir, preciso restabelecer o controle sobre elas e digitar meu nome no final desta crônica...


Luis Hrewq... Luis Henri... Luis Hhnmnfhnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnn...


Roberto Cavalcante

20.8.07

A redundância do olhar

Por Silvia Pereira Nunes


Os olhos são redundantes

Os verbos repetidos,

O calor é cruel

Os gestos imprecisos,

As ações são retornelos

As músicas refrões,

Os dias sofrimentos

Os dedos palpitações,

A boca é inútil

O coração é um órgão

Os pensamentos são vagos e vãos.

As ligações caóticas

Os caminhos parados

As pernas são cíclicas

Os sonhos jamais alcançados.

A água é escassa

A saliva trocada

As noites são claras,

Os objetos símbolos

Os números pessoas

Os joelhos fetiches.

Os carinhos são sussurros

Os beijos viagens

A vida uma miragem.

A mulher é flor

As unhas dor

O céu é limite.

O suor é sexo

A nuca sinceridade

Os doces, doces.

O imbecil é esperto

O silêncio sábio

As regras algo quebrável.

Os movimento inexistentes

Os momentos contínuos.

A mudança é difícil

As roupas estranhas,

O encontro uma batida

A fruta uma queda.

As coisas são coisas

Os conceitos padrões

As vacas soluções.

Os problemas cármas

O ponto é vista

O corte é aberto

A lógica é esta.

A rima é espontânea

As combinações telepáticas

O mundo loucura.

O querer é parco

O estar verbo

E o verbo repetido.

Interesse sujo

Dinheiro certo

Sono pecado.

O suspiro é cinza

O nariz vermelho

O Eu se perdeu-se.

A ingenuidade palhaço

O palco prisão,

O olhar é inquisidor

O outro explorador.

O simples jardim

O tinto é seco.

A casa viagem

A roda parada

A poesia um paradoxo.

A folha é uma tela

O cachorro é coxo

Os livros mazelas.

A liberdade é puta.

A cabeça é singela

As mãos meigas

As canelas são dentes.

O surreal é revisto

O oriente é viceras

O ocidente produção

A loucura impossível.

Agora um olhar

E os olhos redundantes

Os verbos repetidos.


Momento Social:

Eis o e-mail que recebi da adorável Betinha Mânica:

JZ-CONCEPT e HUGO BOSS estão promovendo um BAZAR com peças das marcaIODICE-SAMELLO-VICIO-ZOOMP-PUMA entre muitas outras Grifes conhecidas, a preços imperdíveis.

Parte da renda será revertida para a LIGA DE COMBATE AO CÂNCER e CENTRO ASSISTENCIAL À CRIANÇA COM CÂNCER.

O BAZAR acontece na Rua Fagundes dos Reis,esquina Travessa Júlio de Castilhos(atrás do Colégio Protásio Alves) das 15h. às 19h.



Momento Social - Parte II

O artigo "Tudo é questão de despertar a sua alma", de uma tal de Roberta Scheibe, está na home do site de cultura paulista CRONÓPIOS. Para ler, acesse: www.cronopios.com.br.

19.8.07

Telespectadores desesperados!

Por Giovana Santana Carlos
Na última quarta-feira, estreou na RedeTV! a versão brasileira de “Desperate housewives”, simplesmente traduzida para “Donas de casa desesperadas”, cujo enredo é sobre a vida de cinco mulheres e seus conflitos cotidianos, porém com um mistério a ser resolvido após o inesperado suicídio de uma amiga delas. Esse seriado tem feito muito sucesso no exterior, estando já na terceira temporada. E o Brasil infelizmente resolveu fazer a sua versão.

Comecemos pelo início, então... Na abertura do original é mostrada a mulher (leia-se seu papel na sociedade) ao longo de vários séculos através de imagens e pinturas, que remetem a antiguidade, o renascimento e até mesmo a pop art. Um exemplo é a pintura renascentista de Jan van Eyck, do casal Arnolfini. Sempre achei muito boa essa abertura, tanto que quase a escolhi como objeto de pesquisa para minha monografia, para um estudo semiótico. Pois bem, aqui toda essa complexidade visual e textual se perde em imagens óbvias e simplórias, como dois pares de pés em cima de uma cama se acariciado enquanto em baixo há outro par, dando a idéia de adultério.

O enredo é igual ao norte-americano, as falas e situações são as mesmas, mais que isso, até as roupas e algumas cenas são parecidíssimas, em que se tem o mesmo plano e ângulo, sugerindo muito mais uma imitação barata do que versão nacional. O detalhe é que apesar de ter atrizes brasileiras já consagradas como Sônia Braga e Lucélia Santos, grande parte do elenco secundário tem suas falas dubladas. Isso mesmo, as protagonistas e seus respectivos pares românticos têm mantidas intactas suas falas, mas outra parte do elenco, que fala espanhol (as gravações estão sendo feitas na Argentina), é nitidamente dublada: dá aquele estranhamento quando algum desses abre a boca e o som não está “exatamente” coerente com a movimentação labial! É...ainda não entendi qual é a “jogada” deles...mas a tosquice não é pouca. Embora os cenários e toda essa parte visual (vestes, acessórios, objetos) estar muito bem produzida, a trilha sonora é melosa demais, lembrando novela mexicana.

Tudo bem, foi apenas o primeiro capítulo visto por quem acompanhou o original...mas por que será que sempre que o Brasil resolve fazer sua versão de programas que fazem sucesso lá fora (e aqui também na TV paga), sempre parece inferior, de menor qualidade? Bom...quem tiver o interesse de averiguar os fatos, tem reprise do primeiro capítulo no domingo, às 22 horas. As donas de casas desesperadas aparecem na RedeTV! nas quartas, às 23 horas.